terça-feira, 24 de julho de 2018

Queen size


Ele estava recostado na parede e de repente falou: assim! Fique assim. Congelei na posição e ele começou a me desenhar, em um papel que não era o ideal, mas era o que tinha. Fui amolecendo enquanto ele comentava sobre como meus cílios são longos, e a certa altura tive que esticar a perna esquerda, porque meu joelho tem inflamado e começa a incomodar quando fica certo tempo flexionado, como era o caso, e acrescentei que a fisioterapeuta acha que o joelho é reflexo do quadril, e que ela achava que o quadril, quando inflamava, era reflexo da coluna, portanto, pela lógica, a dor descerá para o pé, até se extinguir por completo, e ele achou graça, e disse que não faltava muito para terminar -- o desenho, não a dor. Ele me estendeu o caderno e vi aquela mulher de cabelos cacheados, de olhos fechados, nua, que era eu, como que adormecida, e se o desenho tivesse som, seria o da voz dele, desconcertantemente suave, que antes tinha perguntado: “Deixa eu te desenhar?”, já sabendo que me desenharia. Ele assinou e confundimos a data: no papel aquela noite aconteceu 24 horas antes. 

Ocorre que mal consegui dormir depois que apaguei a luz, porque tenho essa questão que se impõe quando divido a cama com alguém, até mesmo com meu sobrinho de 7 anos, ou com o vira-lata da minha mãe. Não tem uma explicação concreta, a cama é grande o suficiente para acomodar duas pessoas de 1.70m, ou um pouco mais. No dia seguinte estou quebrada, o colar que eu usava também, acidentalmente arrebentado, o corpo inteiro falha. Escrevo uma mensagem para M., que agora já divide sua cama, mas que antes também torcia secretamente pra pessoa ir embora no meio da noite, ou mesmo antes, assim que tudo já parecesse anunciadamente quebrado ou rompido. Os dias seguintes para ele eram cáusticos, como ainda são pra mim. Durmo pior com alguém ao meu lado que na classe econômica de avião.